quarta-feira, 18 de março de 2009

EXIGÊNCIA DE RESPEITO

Minha rua tem uma casa que, por muitos, é chamada de cortiço. Mas fico sabendo, por um de seus moradores, meu eletricista, que a casa é na verdade um pensionato, no qual ele, meu eletricista, estabelece regras rígidas de segurança e convivência, a partir do fato de que o portão fica permanentemente trancado, e pessoas estranhas só entram se autorizadas por um dos moradores. A vida de meu eletricista, segundo se depreende dos relatos que faz a cada visita, é fascinante. Como anda de chinelo de dedo, sujo de graxa, tinta e reboco, ninguém imagina os profundos conhecimentos de Direito e procedimentos policiais, nem o poder e a riqueza de seus amigos. Também não se consegue supor, a partir de sua aparência pobre, quase maltrapilha, as fortunas que ganha em sua atividade profissional, pelo fato de que, com freqüência, surpreende engenheiros, arquitetos e empreiteiras com soluções inovadoras e inesperadas em eletricidade, hidráulica e construção em geral. Invariavelmente, ao chegar às imensas obras de que participa, alguém (geralmente um segurança, um policial em trajes civis, ou mesmo um morador do prédio, funcionário da empresa, ou outra pessoa que desconfia dele em algo) o inquire de maneira desagradável, o segue na saída, ou, simplesmente, olha para ele de modo que o desagrada. E isso, compreensivelmente, o tira do sério. Seu rosto se contrai ao relatar o fato, sua poderosa voz se alteia, tanto quanto quando o fato relatado ocorreu. Ele revida a desconfiança com desafios, e imediatamente liga, via celular, para um de seus amigos poderosos – ora um investigador, ora um sargento da PM, ora um delegado. Em instantes (ocorra o fato em que cidade for, pois seus trabalhos são requisitados também em cidades do interior) a viatura chega, descem os policiais armados e engatilham suas armas para a pessoa que ele aponta, perguntando a meu eletricista o que quer que façam com seu algoz. Dado o pavor do inimigo e o aprendizado que a situação já lhe trouxe, meu amigo o perdoa. Os policiais – que também têm sido úteis quando um cliente tenta lhe passar a perna, deixando de pagar ou pagando com um cheque de que ele suspeita, ocasiões em que o mau cliente é imediatamente conduzido ao banco, e tem de pagar com multas que podem chegar a 100%, para aprender – advertem o perseguidor, fazem-no ver a sorte que está tendo pelo perdão de meu eletricista, e vão-se, com o infalível ranger de pneus da reluzente viatura. O que impressiona mais é a freqüência, quase diária, com que episódios semelhantes ocorrem na rara vida de meu eletricista.

2 comentários:

  1. Pois é, Ruy querido, conhecemos, você também, uma figura parecida com o seu eletricista: o Toninho! Meu faz tudo até hoje...
    Tó, como a chamamos, tascou, nos idos da década de 70, período dos mais amenos no país, a lei Afonso Arinos na cara do garçom de um restaurante na Rua Pamplona que insistia em não nos atender por conta dele, negro, estar com a gente na mesa...
    Adoro gente assim, gente sabida diria meu avô Mattos!

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  2. Eita!!
    Tõ sentindo falta de mais escrevinhações, Ruyzito!!
    bjos do filhote,
    Saulo

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