segunda-feira, 11 de abril de 2011

REALENGO: O QUE A MIDIA NÃO DIZ

Copio abaixo reflexões do meu amikgo Duarte Pereira sobre o que a midia está deixando de falar e fazer em relação à tragedia do Realengo. Ele começa falando do absurdo privilégio da Globo sobre outras emissoras - privilégio que ocorre em todas as esferas do poder (executivo, legislativo e judiciário) e da iniciativa privada (a não ser nas igrejas dos bispos da Record, é claro!). vale a pena ler.
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Prezad@s amig@s:

O programa “Fantástico” transmitido pela Rede Globo na noite de ontem exibiu novas reportagens sobre a tragédia que se abateu sobre a Escola Municipal Tasso da Silveira, no bairro do Realengo, na cidade do Rio de Janeiro. As reportagens devem ter suscitado novas preocupações nos espectadores atentos.

1) É legal e admissível que a polícia carioca repasse imagens e documentos da investigação para a Rede Globo com exclusividade, discriminando os outros veículos de comunicação?

2) Segundo as imagens transmitidas, as professoras das duas salas de aula invadidas pelo atirador foram as primeiras a fugir, deixando para trás as crianças e adolescentes pelos quais eram responsáveis. Por que a entrevistadora não questionou esse comportamento? Por que as autoridades educacionais do Rio de Janeiro não apuram, nem discutem com as famílias dos alunos, a conduta da direção, dos professores e dos funcionários da escola no episódio, até mesmo para estabelecer padrões de reação escolar na eventual repetição de ocorrências semelhantes? Segundo regra conhecida, o comandante de uma embarcação que naufraga, deve ser o último a abandoná-la.

3) Relatos de colegas de Wellington de Oliveira, reproduzidos pelo programa da Globo, confirmaram que o menino introspectivo e vulnerável costumava ser objeto de gozações e humilhações na escola. Grupos de alunas o cercavam, roçando seu corpo e simulando assediá-lo sexualmente, para o sádico divertimento de outros alunos e alunas que assistiam. Em uma ocasião pelo menos, colegas mais fortes o levantaram pelas pernas, enfiaram sua cabeça numa privada e acionaram a descarga, conforme os entrevistados admitiram. Contraditoriamente, uma das professoras que abandonou precipitadamente a sala de aula, abandonando para trás seus alunos, declarou enfaticamente no programa da Globo que nunca houve “histórico de violência” na Escola Municipal Tasso da Silveira. O que era feito com Wellington não configura violência e violência repetida? Como são supervisionados os banheiros, os horários de recreio e as saídas das escolas, que se têm revelado momentos e espaços críticos para a integridade e a segurança de alunas e alunos mais indefesos?

4) Conforme as declarações de um dos irmãos de criação de Wellington, a mãe deles foi chamada à escola, alertada para o comportamento discrepante do aluno e aconselhada a procurar um psicólogo ou psiquiatra para avaliá-lo. Isso foi feito? Em nossa sociedade capitalista, sobretudo na fase neoliberal e privatizante que atravessa há cerca de duas décadas, existe serviço público na região capaz de assegurar esse atendimento, tratamento e acompanhamento? Por que esses aspectos da tragédia não são pesquisados, nem discutidos?

5) Por que não têm sido ouvidos juristas competentes sobre os aspectos penais envolvidos em atos de jovens esquizofrênicos, mesmo que esses atos sejam chocantes, brutais e injustificáveis como os que abalaram a escola do Realengo? Se Wellington tivesse sobrevivido, ele poderia ser levado a júri e condenado à prisão? É correto tratá-lo raivosamente como “criminoso” e “assassino” como qualquer jovem normal e imputável, esquecendo seu prolongado e negligenciado sofrimento mental? A dor merecida pelas vítimas de sua insanidade e a solidariedade com os familiares dos alunos mortos e feridos devem impedir a solidariedade com os familiares do autor dos disparos e a compaixão pelo jovem que premeditou e executou o massacre e acabou sendo vítima de seus próprios atos tresloucados?

A tragédia do Realengo precisa ser debatida de forma séria e multilateral se a intenção for evitar a repetição de ocorrências semelhantes e não apenas disputar índices de audiência.

É preciso insistir: tudo que é humano é inseparavelmente individual e social. Inclusive a loucura e suas consequências. O capitalismo contemporâneo incentiva, mais do que nunca, o individualismo, a competição, a insensibilidade. Exalta os vencedores e despreza os derrotados. Pode queixar-se de colher os frutos de seu darwinismo social?

Duarte Pereira
11/4/2011

4 comentários:

  1. Caro Ruy,
    Meus parabéns ao Duarte, Não tenho uma vírgula a acrescentar. Essa é a discussão que precisa ser levada adiante. E não os factóides que as autoridades agora teimam anunciar para iludir a população e desviar a atenção de seus descaminhos. Grande abraço! Ibsen.

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  2. Preciso e lúcido, Ruy.
    um beijo para você.
    Déborah

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  3. Prezado Ruy.
    Muito grato por prestigiar o meu blog, visitando e deixando suas impressões. Milton B., meu editor em Sampa, me falou com entusiasmo da sua presença nos comentários. Sempre à sua escuta, forte abraço!

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