quarta-feira, 12 de setembro de 2012

PALESTRA RUY FERNANDO BARBOZA NA UNISUL (OBRIGADO, CINTHIA)

11/07/2012 PRATA DA NOITE
Memórias, polêmicas e conselhos do repórter Realidade .Em conversa com alunos de jornalismo da Unisul, o ex-repórter da revista Realidade Ruy Fernando Barboza conta histórias de derrota e vitória contra a censura por Cinthia Fraga, aluna do Curso de Comunicação Social da Unisul, SC "A figura quase insignificante daquele índio de pele escura assume uma grave imponência no palanque, os traços duros de seu rosto recortados contra o azul vivo do céu dos Andes.” Essa foi uma das frases do pequeno trecho de uma belíssima reportagem escrita por Ruy Fernando Barboza para a revista Realidade, em junho de 1972, lida pela professora Raquel Wandelli ao iniciarmos o encontro com esse experiente jornalista. O bate-papo aconteceu na terça-feira à noite do dia 8 de maio, no campus da Unisul Pedra Branca. A leitura de introdução serviu para mostrar quão sensível era o homem de cabelos grisalhos e sorriso fácil com quem iríamos conviver por quase três horas. Ruy Fernando Barboza é graduado em Direito e Psicologia, entretanto, trabalhou durante vários anos como jornalista em grandes veículos de comunicação, como no jornal Folha de S. Paulo, revistas Realidade, Quatro Rodas, Playboy, Nova e Veja. Também atuou em emissoras de rádio e televisão, além de implantar o curso de Comunicação Social da Universidade Estadual de Londrina, no Paraná. Hoje Ruy mora no Campeche, em Florianópolis, mas viaja constantemente a São Paulo, onde mantém projetos com publicações nacionais. A experiência adquirida durante anos de trabalho serviram de base para contar várias histórias e situações vividas por Ruy. “Quero tentar aprofundar um pouco alguns momentos do que aconteceu nessa minha história que eu acho que podem ser importantes para quem está estudando jornalismo hoje. São histórias de outras épocas que eu trouxe para os alunos, mas vim também para ouvi-los.” Ruy revela que, na revista Quatro Rodas, de conteúdo automobilístico, ele sofreu várias pressões de grandes empresas de automóveis que tentavam censurar suas matérias. Quando era editor chefe da Playboy, tinha que lidar com a censura política e a sexual, mas conta que, apesar disso, a revista apresentava matérias com discussões políticas de alto nível, bastante aprofundadas, contando com autores de primeira linha e entrevistadores muito bons. Ruy trabalhou também na TV Justiça, mas foi por pouco tempo, pois demitiu algumas pessoas e encontrou muitos problemas por causa disso. Segundo ele, tinha inúmeros projetos, mas como não quis “entrar no esquema”, teve que sair. Nada, porém, se compara ao trabalho desenvolvido por Ruy na revista Realidade. Seus olhos brilham e sua expressão muda quando ele fala dessa época. “Na revista Realidade, tudo era feito coletivamente; trocávamos ideias, fazíamos as reuniões de pauta para decidir as matérias e os planejamentos. E o mais interessante ainda estava por vir: saíamos às ruas e às vezes encontrávamos coisas inesperadas e surpreendentes. Nessa época, nós tínhamos tempo para realizar as reportagens, dinheiro para os custos e autonomia para criar, mudar a pauta, aprofundar os assuntos.” Ruy conta que foi a melhor coisa que ele fez e depois dessa experiência, sabia que nunca mais sentiria o mesmo prazer. “Eu gostava de defender o meu trabalho, dava palpites na legenda das fotos, nos títulos das matérias, em tudo.” A revista Realidade foi realmente muito marcante para o jornalismo e para a vida de Ruy. Sentado em frente aos alunos, entre perguntas e respostas, ele sempre retoma essa época e parece muito leve ao contar suas histórias, rever imagens de capas da revista e lembrar-se de fotos, entrevistados e textos que apareceram nas reportagens. Ele se entristece ao falar de como a revista declinou. “A Realidade ia muito bem até que a Editora Abril resolveu fazer uma revista semanal para criar uma presença mais forte no mercado editorial, surgindo assim, a revista Veja.” Ruy conta que ficou pouco tempo no novo projeto porque não gostou do jeito que começaram a fazer jornalismo. Relata que, no início, a revista era produzida com jornalismo de verdade, mas que depois foi entrando capital estrangeiro e isso foi interferindo nas decisões políticas, econômicas e editoriais da revista. “Na Veja, você recebia a linha central da matéria e tinha que ir buscar coisas na rua para se encaixar naquela definição que já tinha sido feita. Eu não concordei com esse método e saí.” Surgiram, algum tempo depois, muitas revistas e jornais no Brasil com o espírito da revista Realidade, como a revista Retratos do Brasil, o Jornal Movimento, o Jornal Opinião, a revista Caros Amigos, entre outros. Atualmente, sempre que é possível, Ruy contribui para a Retratos do Brasil, que é uma revista de esquerda, como ele bem define, de caráter independente, que se utiliza de pouquíssimos anúncios publicitários e diferentemente da revista Realidade, com orçamento bem pequeno. Quando o bate-papo estava se encaminhando para o final, com alguns alunos já indo embora e o horário avançando, o jornalista cria certa polêmica ao dizer que é contra a exigência do diploma para jornalistas. Segundo Ruy, não há necessidade de curso superior, pois acredita que se pode aprender jornalismo na prática, assim como ele fez. Faz questão de esclarecer que não está desanimando os estudantes, nem dizendo que a passagem pela universidade não é importante, mas que para ele os cursos de jornalismo teriam melhor qualidade se o diploma não fosse obrigatório. Acredita que sem a exigência não haveria por parte dos alunos a busca pelo diploma e sim a procura por uma formação melhor, por qualificação, por aprimoramento pela profissão pela qual são apaixonados. Finalizando a noite, Ruy diz que a grande imprensa é dona de muita coisa e vai defender o capital sempre, mas que há espaços para fazer um jornalismo diferente. Acredita que as empresas querem vender, mas que não é fácil manipular as pessoas o tempo todo. “É preciso assumir responsabilidades, fazer análises, dizer o que está acontecendo, aprofundar, ser incansável na vontade de mudar. Tem que tentar, ousar! Jornalismo é a arte de dizer o que é, o que causou e a sua importância. Eu acredito que o espaço é maior do que a gente imagina, mas se aparecerem situações em que precisamos brigar, nós vamos brigar. Devemos mexer na realidade, meter a mão na história.” E é com essa enriquecedora conversa que nós, futuros jornalistas, fomos embora, levando na memória esse encontro nos sentindo, como disse Ruy, cada vez mais felizes e culpados, culpados de olhar para tudo de um jeito profissional, com um olhar diferente, com olhar de jornalista!

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